Poluição sonora: como resolver


Você sabia que poluição sonora, isto é, a emissão sonora acima dos limites estabelecidos em regulamentos próprios, pode configurar crime, infração administrativa e gerar o direito a reparação civil (indenização)? Pois é. A mesma é vedada, conformne Leis Municipais, bem como de crime tipificado no art. 54 da Lei n. 9.605/1998, também chamada de Lei de Crimes Ambientais, a qual não se confunde, mas pode cumular, com a contravenção penal disposta no artigo 42 do Decreto Lei n. 3.688, conhecido como Lei de Contravenções Penais (perturbar alguém, tanto o trabalho quanto o sossego alheio – com gritaria ou algazarra, exercendo ruidosa, abusando de instrumentos sonoros ou provocando barulho com animais de estimação, sendo ambas é passíveis de prisão e multa). Mas, como resolver esse dilema que aflige tanto a vida moderna, especialmente nos centros urbanos e cidades?

Primeiramente, cumpre esclarecer que, para caracterizar a produção de ruídos como poluição sonora, deve ser precedida de laudo técnico comprovando a possibilidade de prejuízos à saúde e à qualidade de vida, bem como a frequência da exposição. A primeira providência é, portanto, elaborar tal laudo, com a requisição do município, contratação de um técnico ou mesmo de um aplicativo de celular, confiável para tal.

Demais disso, poluição sonora é um problema que pode afetar os direitos difusos, pertencentes a todos, inclusive à próxima geração, e envolve três esferas relacionadas à área do meio ambiente: qualidade de vida, planejamento urbano e patrimônio cultural. Assim sendo, pode haver uma representação dos afetados junto ao Ministério Público, a fim de que este adote providências.

E não se deve banalizar a questão do dano moral. Ao contrário do que diz a nova expressão desta geração, não se trata de “mimimi”. De acordo com um estudo publicado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), alguns dos possíveis danos causados pela exposição a ruídos são perda de audição e concentração, aumento da pressão arterial, interferência no sono, problemas gástricos, estresse e aceleração cardiovascular.

Por sua vez, a Resolução nº 001/1990 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) regula os critérios para a emissão de ruídos em atividades comerciais, industriais, sociais ou recreativas, incluindo as de propaganda política. Conforme indica a Resolução, os ruídos considerados prejudiciais à saúde e ao sossego público são estabelecidos pela norma NBR 10.152 – Avaliação do Ruído em Áreas Habitadas -, da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). A norma estipula valores, em decibéis, para ambientes como hospitais, escolas, bibliotecas, locais de circulação, residências, restaurantes, igrejas e templos e locais para esporte.

Com efeito, sabe-se que a poluição sonora não é daquelas que deixa resíduos, acúmulos poluentes na terra, ar, ou mar, mas afeta o organismo dos seres vivos – tanto dos seres humanos, quanto dos animais – e seus efeitos podem causar problemas gravíssimos. É, inclusive, considerado um problema de saúde pública mundial, pois afeta a saúde física e mental da população que é submetida a essa poluição. Dessa forma, a poluição sonora ocorre quando o som altera a condição normal de audição em um determinado ambiente. O ruído, por exemplo, é o maior causador da poluição sonora, seja pelo som das produções industriais, meios de transporte, obras urbanas, festas, shows, etc. 

A Organização Mundial de Saúde (OMS) considera que um som deve ficar em até 50 decibéis (unidade de medida do som) para não causar danos ao ser humano, pois a partir desse nível, os maus efeitos começam, como: dificuldades intelectuais, falta de concentração e muita tensão. Acima dos 65 dB os indivíduos apresentam colesterol elevado, imunidade baixa e aumento dos índices de morfina, podendo torná-lo quimicamente dependente do cigarro, por exemplo, e de qualquer outro tipo de droga. Acima dos 70 dB as consequências são ainda piores, tendo incidências de zumbidos, tontura, e aumentando também as chances de infarto, além de começar a afetar as estruturas de audição, levando, progressivamente, à perdas auditivas e podendo chegar a surdez caso a pessoa fique sujeita diariamente, durante 8 horas seguidas, a sons com intensidade superior a 85 decibéis. O ruído de 140 dB pode destruir totalmente o tímpano.

Cumpre consignar, também, que poluição sonora afeta os animais, deixando-os extremamente estressados, atrapalhando seus instintos de caça, sua reprodução e interferindo em sua comunicação. 

Lado outro, eventos e atividades podem ser favoráveis quando realizados em determinadas áreas, pois promovem a ocupação dos espaços e previnem contra a criminalidade. Mas devem ser realizados sem causar transtornos aos moradores e respeitando os limites de horários. Mesmo assim, algumas pessoas ainda podem ser afetadas pelo barulho, como aquelas que trabalham durante a noite e precisam descansar durante o dia; ou as que usam horários diurnos para atividades de concentração (trabalho ou estudo). Por isso, nos conflitos causados por problemas relacionados à poluição sonora, alguns termos não são negociáveis. O limite de decibéis, por exemplo, é estabelecido por lei e não pode ser modificado. Horários e periodicidade devem ser fixados para eventos que causam barulho excessivo, mas eventos esporádicos podem ter maior flexibilidade nesse sentido. Assim, de acordo com a consensualidade, estipulada como pressuposto da solução de conflitos de forma cordial e mediada pela Lei de Introdução ao Direito Brasileiro, é possível e recomendável solucionar este tipo de passivo com uma concertação entre as partes envolvidas e interveniência dos órgãos ambientais e do Ministério Público, mantendo o equilíbrio entre as atividades de uma região e o respeito à vizinhança. 

Portanto, resta claro que a produção de ruídos afeta uma coletividade, prejudicando a qualidade de vida e a relação entre as pessoas de uma localidade, o cidadão pode e deve mobilizar as autoridades, nas esferas civis, criminais e administrativa, notadamente junto ao órgão de controle ambiental e urbanístico municipal, o Ministério Público Estadual, a delegacia de polícia e mesmo, diretamente, o judiciário. Mas a melhor via de resolver estas celeumas ainda é um bom acordo.

Prof. Dr. Georges Humbert, autor de 40 livros e mais de quinhentos artigos, orientações e pesquisas. Advogado e gestor certificado. Pós-doutor em direito pela Universidade de Coimbra – Portugal. Doutor e mestre em direito do estado pela PUC-SP.  É presidente do Instituto Brasileiro de Direito e Sustentabilidade – IBRADES e Membro da Comissão de Defesa do Meio Ambiente da OAB-BA, do Instituto dos Advogados Brasileiros e do Núcleo de Sustentabilidade da Associação Comercial da Bahia. Foi Superintendente de Patrimômonio da União, Gerente de Projetos do Ministério do Meio Ambiente, Assessor Especial Secretaria-Geral da Presidência da República, Superintendente de Políticas Ambientais de Goiás, membro do CONAMA, do Conselho de Respostas a Desastres do Conselho de Governo da Presidência da República, do Conselho de Meio Ambiente da FIEB e da Câmara Florestal do Brasil e da Bahia.

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