Com personagens sombrios e cenas de sexo explícito, obra trata de temas perturbadores
Pavor de Viver é o mais novo livro do pesquisador, acadêmico e escritor Nilton Milanez. Uma leitura que não cabe nos moldes dos livros convencionais, não só pela temática LGBTQIA+ mas pela forma com que desnuda intimidade e conflitos de quem ama fora dos padrões convencionais. E que acaba revelando também muito sobre a sociedade que vivemos. Uma obra capaz de aguçar identidade e reflexão sobre corpos masculinos que se atraem, carregados de amor, carências afetivas e dores. “Ser gay era um lugar de exclusão. Era um modo de vida inaceitável há décadas atrás. Hoje, avançamos em alguns aspectos, mas muitos problemas persistem. Já contamos com um freio social pela visibilidade, avanços jurídicos e políticas públicas”, avalia o escritor e acadêmico da Universidade do Estado da Bahia (UNEB).
Por trás do seu jeito reservado, Nilton descortina retrato franco de homens gays em faixas etárias diferentes, que revelam muito sobre desamparo, abusos e preconceitos, trazendo sempre como tônica o viés cortante do gênero. Pavor de Viver é seu segundo livro solo. O primeiro foi autobiográfico intitulado Audiovisualidades em Mim: autoanálise foucaultiana, criança viada e corpo na ditadura (Editora Labedisco). Do menino que cresceu no interior de São Paulo com o conflito de desejar corpos masculinos em uma época de muita repressão ao pesquisador da temática, Nilton traz em suas obras literárias um duplo olhar de quem vivencia e se debruça sobre os estudos de gênero. “São histórias do que vivi, conheci e imagino que revelam um pouco do terror que os gays ainda vivem diante da sociedade”.
Pavor de Viver tem linguagem rápida, lembra uma série de TV. A narrativa entrecortada cria identificação entre pessoas leitoras LGBTQIA+, impacta simpatizantes e aguça também a curiosidade do público em geral. E o livro ainda inova por chegar ao mercado editorial com trilha sonora. Cada conto traz QRCode com indicação de uma playlist que acrescenta todo sentido à leitura. Afinal, na ficção e na vida real, as relações afetivo-sexuais estão “fora e para muito além desse binômio religioso e político de controle do corpo alheio”.
+18. HOT. DARKLOVE
A capa vermelha sinaliza que a obra é indicada para leitores maiores de 18 anos. Pavor de Viver reúne quatro contos que têm em comum a temática dos atravessamentos, dos percalços, medos, temores da vida gay, escritos por um homem gay, cis e acadêmico que se debruça sobre pesquisas em torno das sexualidades há 20 anos. O Cinderelo conta a história de um homem de 65 anos que não se sabe se está à beira da morte ou se vai resistir ao golpe de ser dopado, ao ingerir uma bebida alcoólica misturada com substâncias alcaloides. “É bem o que a gente vive e estes temas não são ditos em todo lugar”, reitera o escritor.
As outras histórias apresentam personagens tão familiares, que vivem os desencontros do amor, especialmente das pessoas que conjugam este verbo para além de um regime binário. Please don´t Go narra a história de um jovem estuprado pelo tio na infância, que tem dificuldade de se relacionar. Oculta a dor e a sexualidade na companhia de um boneco inflável porque não reconhece a violência da qual foi vítima. O terceiro conto, FAZUELE, aborda desde a temática das drogas, à ideologia política, aos conflitos de um casal gay que, na tentativa de encontrar a tal felicidade, pode chegar à configuração de um trisal. No quarto e último conto, Triste Família Feliz, o cotidiano de uma família gay infeliz é marcada por relacionamento tóxico e pela adoção para manter o casamento. Em todo livro, pitadas de cenas de sexo. “Não são apenas cenas eróticas com objetivo de gerar excitação; são cenas que revelam sobre os personagens e desnudam situações bem comuns”, explica Milanez.
Pavor de Viver tem ilustrações de Felipe Soares, pesquisador da estética queer e doutor em Letras pela Universidade Estadual do Centro-Oeste (UNICENTRO_PR). Na obra, utiliza técnica, ótica artística e sensibilidade para dar contornos à narrativa visceral do autor. Nilton resolveu mergulhar nos estudos literários depois que traduziu a obra A Hermafrodita (Eduel/Edunicentro), romance do francês Armand Dubarry. O adulto que ainda sentia na pele as dores de uma infância reprimida, ao descobrir a própria homossexualidade em plena ditadura, começou a querer falar de si. “Escrevia quando criança. Na vida adulta, não mais. Mas este lugar sempre ficou marcado”, conta. Foi assim que escreveu seu primeiro livro autobiográfico Audiovisualidades em Mim: autoanálise foucaultiana, criança viada e corpo na ditadura (Editora Labedisco). “É um livro escrito a partir da autoanálise da minha vida enquanto criança, mas levando em conta a teoria que estudo”.
Quem é Nilton Milanez?
Natural de Itatiba, interior de São Paulo, Nilton Milanez, 57 anos, veio para a Bahia em 2007 como professor concursado do estado. Atualmente, é professor pleno do Colegiado de Letras da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), em Salvador. Tem pós-doutorado em Discurso, Corpo e Cinema na Sorbonne Nouvelle (2010-2011) e em Estudos Literários pela Universidade Federal de Uberlândia (2020-2021). Tradutor de A Hermafrodita (Eduel/Edunicentro), romance francês de Armand Dubarry, é autor de Audiovisualidades em Mim: autoanálise foucaultiana, criança viada e corpo na ditadura (Editora Labedisco) e de Pavor de Viver: Contos Gaysex (Editora Bambi Brasil).
SERVIÇO:
O quê: Pavor de Viver: Contos Gaysex (Editora Bambi Brasil), 114 páginas
Quando: Lançamento, 26 e 27 de julho de 2024
Onde: Feira Literária de Mucugê (Fligê)
Quanto: R$ 35,00 (valor de capa do exemplar)
(10.07.2024)
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